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Destaques

O ano passado trouxe contribuições relevantes para a agenda de reforma do financiamento internacional, incluindo o Financiamento para a Ação Climática (o “relatório Songwe-Stern”), a Agenda de Bridgetown e a Revisão Independente dos Quadros de Adequação de Capital dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento, apresentada aos ministros da fazenda dos países do G20.

O ano de 2023 será fundamental para a implementação de reformas que atendam à escala e à urgência da crise climática, ao mesmo tempo que tratam das outras crises enfrentadas pelos países em desenvolvimento — a inflação dos preços dos alimentos e da energia, a sustentabilidade da dívida, entre outras — e ainda das prioridades de desenvolvimento previstas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os mercados emergentes e as economias em desenvolvimento (Emerging Markets and Developing Economies – EMDEs) mais afetados pelo aumento do custo do capital e pela crise da dívida soberana são também alguns dos mais vulneráveis aos impactos climáticos. Para eles, é difícil atingir as estabilidades financeira e fiscal necessárias para investimentos em clima e transição.

As pressões internacionais e a mudança de liderança no Banco Mundial criaram oportunidades para reavaliar a postura das instituições financeiras internacionais em relação ao clima; é preciso um aumento dramático do volume de financiamento utilizado pelo sistema financeiro internacional para atender às necessidades de financiamento climático. À medida que os acionistas buscam reformar a arquitetura financeira internacional, é importante considerar não só de onde virá o capital extra, mas também como o capital pode ser efetivamente gasto para causar o máximo impacto climático e de desenvolvimento. 

Este relatório apresenta os principais produtos e processos que precisam ser introduzidos, reformados e/ou ampliados para implementar de forma eficaz os volumes necessários (atuais e novos) de financiamento climático para os EMDEs. O relatório centra-se nos bancos multilaterais de desenvolvimento (BMDs), reconhecendo que as instituições diferem em termos de missão, estratégia e geografia e, assim sendo, algumas recomendações só podem ser aplicadas a um subconjunto de BMDs. É o que acontece mesmo a despeito dos papéis fundamentais de outras instituições, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e outros bancos públicos de desenvolvimento (BPDs). Este estudo baseia-se em relatórios de referência, como o “relatório Songwe-Stern”, e centra-se em modelos específicos que podem ser adotados e ampliados rapidamente. 

Este relatório desenvolve uma série de discussões convocadas pelo Climate Policy Initiative (CPI) em março de 2023, no âmbito do Grupo San Giorgio.[1] 

Dividimos as ações em três categorias: 

  • Maior foco na escala das plataformas setoriais nacionais, afastando-se da atual abordagem “projeto-a-projeto” e aproximando-se de instituições de financiamento mais baseadas em programas com o intuito de levar a cabo mudanças sistêmicas. Isso implica focar no financiamento baseado em necessidades, de forma a utilizar eficazmente os recursos internacionais e nacionais para aumentar a qualidade do financiamento, apoiar mudanças que incentivem o capital privado nacional e defender a integração das principais instituições financeiras nacionais e subnacionais em prol da agenda climática nacional.
  • Implementação em grande escala de instrumentos de compartilhamento de riscos para catalisar o capital privado e apurar o custo de capital, nomeadamente através de produtos de garantia novos e ampliados, mecanismos para enfrentar os riscos cambiais e aumentar o financiamento em moeda local e mecanismos de elaboração de projetos. 
  • Revisão completa do modelo de negócios do Banco Mundial e de outros BMDs que os reposicione como “principais mobilizadores”, incluindo a padronização de diversos processos, a otimização de balanços patrimoniais através de um novo modelo de “originar-para-distribuir”, elegibilidade para financiamento concessional, compartilhamento de dados entre países e uma resposta que atenda às necessidades das policrises atuais. 

Ampliação de Plataformas Setoriais Nacionais

O financiamento dos BMDs precisa abandonar a abordagem projeto-a-projeto — que muitas vezes funciona de forma ad hoc — e adotar uma abordagem de plataforma setorial nacional com cunho coordenado e colaborativo, que culmine em uma visão mais coesa com impactos de longo prazo. O sucesso da plataforma setorial nacional depende de uma combinação de ambição e apoio para gerar mudanças transformadoras. Essa ampliação deve incluir a expansão e o apoio a plataformas setoriais no país, como as Parcerias para uma Transição Energética Justa (Just Energy Transition Partnerships – JETPs) e os Planos de Prosperidade Climática V20.[2] A integração de instituições financeiras nacionais — especialmente dos ministérios da fazenda e dos bancos nacionais de desenvolvimento — nas plataformas setoriais nacionais numa fase inicial é fundamental para garantir o equilíbrio da plataforma. 

O financiamento das plataformas setoriais nacionais pode começar com foco na qualidade do financiamento, com vistas a produzir resultados sistêmicos. Devem ser consideradas as novas direções emergentes lideradas por iniciativas do Sul global e que visam elevar a qualidade do financiamento. Por exemplo, o Plano de Investimento JET da África do Sul[3] define uma série de princípios de financiamento como base para o financiamento de sua JETP. Uma proposta de “Just Term Sheet”,[4] para ajudar na padronização do financiamento dos esforços de transição justa, é uma forma prática de colocar as pessoas e o planeta no centro das negociações de financiamento para transições justas e equitativas. Essas abordagens têm um foco comum no financiamento baseado em necessidades e nos impactos sistêmicos, indo além do financiamento projeto-a-projeto e aumentando a resiliência fiscal e social por meio de acordos de compartilhamento de riscos que proporcionam, coletivamente, uma transição justa e equitativa. As “Just Term Sheets” podem delinear os preços de investimento, identificar as abordagens e os instrumentos necessários de compartilhamento de riscos, assim como os parceiros envolvidos. Plataformas como as JETPs e os Planos de Prosperidade Climática V20[5] reúnem diferentes atores, como comunidades, sindicatos, financiadores, investidores e decisores políticos. Por isso, são uma base útil para discutir sobre a qualidade do financiamento necessário para diversos atores em nível nacional e o compartilhamento efetivo dos riscos.

Os BMDs desempenham um papel fundamental de apoio aos países na realização de ajustes nas políticas de modo a incentivar os investimentos climáticos tanto por parte de instituições financeiras nacionais quanto internacionais. O apoio financeiro à capacitação e aos esforços de reforma através de subvenções diretas e empréstimos baseados em políticas é capaz de potencializar um investimento privado significativo. Por exemplo, subvenções que apoiam projetos de leilões de energias renováveis já mobilizaram muitas vezes os investimentos iniciais. O apoio dos BMDs à capacitação dos EMDEs em todas as partes do processo de financiamento climático é fundamental para mobilizar capital.

Os atores financeiros nacionais — incluindo reguladores financeiros, bancos de desenvolvimento nacionais e subnacionais, fundos de previdência, seguradoras e bancos locais — precisam fazer parte das plataformas de investimento desde o início do processo. Entre 2011 e 2022, 76% de todos os fluxos de financiamento climático foram captados e gastos internamente.[6] O financiamento interno pode representar cerca de 50% do financiamento climático necessário nos EMDEs,[7] mas é fundamental ativar esse capital por meio da capacitação e do compartilhamento de riscos. Os EMDEs com mercados de capitais nacionais mais sofisticados provavelmente precisarão de menos subsídios para mobilizar capital, especialmente para projetos com perfis de receitas fortes, reservando, portanto, os subsídios para os países menos desenvolvidos. Para mobilizar o capital interno necessário, os BMDs precisarão melhorar a coordenação e o compartilhamento de dados com os atores financeiros nacionais, como os bancos centrais e BPDs locais. Porém, há poucos dados disponíveis sobre os níveis atuais de despesa, poucos sistemas em funcionamento para acompanhar os níveis de despesa nacional de fontes privadas e públicas, bem como informações escassas sobre o impacto do financiamento nacional ou internacional na economia. Uma melhor coordenação com os bancos centrais, ministérios da fazenda e BPDs locais pode ajudar a preencher as atuais lacunas de conhecimento e a criar plataformas eficazes para compartilhar dados e melhores práticas.

Qualquer mudança em nível nacional exigirá a integração do ministério da fazenda nacional e das principais instituições financeiras públicas nacionais para fomentar a agenda climática. Existem oportunidades de engajamento com os ministérios da fazenda por meio da Coligação de Ministros da Fazenda para a Ação Climática, que visa reunir os tomadores de decisão de políticos fiscais e econômicos para liderar uma resposta climática em nível global. Em se tratando de reformas, os avanços dos ministérios e de outras instituições financeiras podem ser lentos; por isso, os BMDs devem envolvê-los desde o início e com frequência, criando parcerias duradouras para as ações desenvolvidas no país.

Instrumentos de Compartilhamento de Riscos para Catalisar o Capital Privado

O custo do capital nos EMDEs torna projetos inviáveis para investidores financeiros,[8] indicando um papel fundamental dos BMDs na mobilização do investimento privado por meio do compartilhamento de riscos, como os riscos de crédito, do comprador, político e de liquidez. O FMI, no entanto, constatou que os BMDs captam financiamento privado, em média, apenas cerca de 1,2 vezes os recursos que eles próprios aportam.[9] A mudança para uma abordagem baseada em programas, com ênfase em garantias, moeda local e outros instrumentos, exigiria mudanças de incentivos internos nos BMDs, principalmente, em suas vertentes no setor privado. No entanto, poderia trazer maiores volumes de financiamento privado, ajudando as instituições financeiras privadas a superar riscos reais e percebidos, bem como outros obstáculos ao investimento. 

Os BMDs precisam implementar mecanismos e instrumentos financeiros capazes de captar e alavancar capital na escala e velocidade necessárias, ao mesmo tempo que enfrentam alguns obstáculos críticos do sistema atual. Alguns desses mecanismos requerem reformas a longo prazo, especialmente em relação à propensão ao risco e aos modelos de negócios dos BMDs, para que os próprios BMDs possam oferecer mais garantias, conceder mais empréstimos em moeda local e/ou facilitar a concessão de empréstimos em moeda local utilizando garantias off-shore, além de apoiar projetos em fases iniciais de desenvolvimento. A curto prazo, diversas iniciativas já estão prontas para serem introduzidas ou ampliadas; esta seção destaca algumas delas. 

Para mobilizar os volumes de financiamento privado necessários e reduzir o custo do capital, será necessário mobilizar garantias em maior escala. Uma avaliação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) concluiu que as garantias alavancaram 26% de todo o financiamento privado mobilizado entre 2018-2020 e foram a ferramenta de financiamento misto preferida por investidores privados.[10] Os BMDs precisam fornecer mais garantias a partir dos seus próprios balanços patrimoniais e também colaborar com os provedores de garantias existentes para implementar ainda mais garantias.  Recomendamos ampliar, reformar e/ou criar as seguintes iniciativas:

  • O “esverdeamento” da Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (Multilateral Investment Guarantee AgencyMIGA) — especializada em garantias de risco político, para incentivar o investimento direto estrangeiro em EMDEs — precisa ser ampliada consideravelmente; além disso, precisa aumentar as garantias para projetos verdes e a eficiência de seus processos para mobilizar o montante necessário de financiamento privado. Adicionalmente, a introdução de um produto completo de proteção de pagamentos, ainda que de forma sintética — por exemplo, combinando o produto existente de melhoria de crédito da MIGA em caso de falta de pagamento por parte de ente (sub)soberano com um mecanismo de liquidez que cubra a falta de pagamento dentro do prazo por ente (sub)soberano — contribuiria para atrair mais investimentos privados para os EMDEs e para os setores de maior risco. 
  • A GuarantCo, que integra o Private Infrastructure Development Group (PIDG), oferece garantias a bancos e investidores em títulos para desenvolver projetos de mercado de capitais baseados em moeda local.
  • A Green Guarantee Company é a primeira garantidora de crédito do mundo dedicada a soluções climáticas no mundo em desenvolvimento. 
  • A iTrust é um sistema de garantia pré-financiado para todos os projetos de determinado edital, oferecido pela Greenmap, que auxilia os governos na concepção e execução de programas de aquisição de energia renovável. 
  •  O Climate Policy Initiative (CPI) propôs uma garantia de crédito de dívida para energias renováveis e outros projetos climáticos em mercados emergentes com base em capital exigível. 
  • A proposta de Garantia de Receita Global (Global Revenue Guarantee – GREG) da FAST-Infra asseguraria pagamentos oportunos em nome de mutuários (sub)soberanos por meio de uma combinação de financiamento público e privado.

Os mutuários identificaram as taxas de câmbio como um risco em todos os níveis de projeto, desde a preparação até a fase operacional, mas principalmente para o financiamento de despesas de capital (CAPEX). Um estudo recente concluiu que aproximadamente 60% da dívida em moeda estrangeira emitida pelas empresas é denominada em dólares americanos e outros 23% são denominados em euros.[11] Os BMDs precisam apoiar soluções que aumentem os projetos de investimento com empréstimos denominados em moeda local, em vez de empréstimos em moeda forte ou uma combinação dos dois. As soluções que devem receber apoio incluem:

  • Ampliar o Currency Exchange Fund (TCX), um pool cofinanciado que atua em EMDEs para oferecer instrumentos financeiros, principalmente swaps e contratos a prazo, que possibilitam aos investidores financiar mutuários em moeda nacional, transferindo, ao mesmo tempo, o risco cambial para o TCX. Para tal, a precificação comercial do TCX provavelmente precisará estar associada a algum tipo de pool de financiamento concessional independente, conforme demonstrado pela combinação de soluções de taxas de mercado oferecidas pelo TCX com a janela de financiamento em moeda local do setor privado sob o âmbito da Associação Internacional para o Desenvolvimento (AID).
  • Explorar outras propostas, como a Just Environment Transition – Foreign Exchange Investment Trust (“JET-FIT”) para utilizar as garantias respaldadas por DSEs a fim de reduzir ainda mais os custos de cobertura nos países participantes de JETPs. Construir mercados de capitais nacionais para que se tornem fontes de financiamento para ações climáticas por meio de capacitação, o que, por sua vez, aumentará a capacidade de gestão de risco dos mutuários. 
  • Garantir capital nacional para mobilizar investimentos em moeda local e desenvolver setores financeiros verdes locais, apoiando, por exemplo, a emissão de títulos locais e a capacidade municipal de tomar crédito (creditworthiness).

Os mecanismos de elaboração de projetos e as plataformas de desenvolvimento que apoiam a criação de projetos financiáveis e prontos para investimento nos EMDEs serão fundamentais para aumentar os investimentos climáticos. Com frequência, o capital mobilizado pelos financiadores privados é limitado, porque eles não conseguem encontrar projetos que atendam aos seus critérios de investimento; já os patrocinadores de projetos lutam para garantir o financiamento, devido aos elevados riscos atrelados ao desenvolvimento de projetos. As estimativas globais das necessidades de financiamento para a elaboração de projetos variam entre 5% e 10% do custo total de investimento, embora esse montante varie conforme a região.[12] Os próprios BMDs, no entanto, não costumam investir na elaboração de projetos pelos mesmos motivos que os investidores privados. Os mecanismos de elaboração de projetos e as plataformas de desenvolvimento podem lidar com esses riscos apoiando o desenvolvimento de projetos climáticos financiáveis nos EMDEs e ajudando a atrair financiamento privado. Os mecanismos de elaboração de projetos, como o PID, GIF e Gap Fund, que necessitam de apoio para ampliação incluem: 

  • O programa de assistência técnica do Private Infrastructure Development Group (PIDG) apoia o desenvolvimento de projetos e transações em todo o ciclo de vida dos projetos, alocando mais de 51 milhões de dólares a 262 subvenções de assistência técnica até o final de 2021.  
  • A Global Infrastructure Facility (GIF), uma iniciativa do G20 no âmbito do Banco Mundial, foi criada para resolver o problema da escassez de projetos financiáveis de infraestrutura e trabalha para elaborar pipelines de projetos de infraestrutura com potencial de atrair financiamento privado. 
  • O City Climate Finance Gap Fund, no âmbito do Banco Mundial e do Banco Europeu de Investimento, ajuda as cidades dos EMEDs a transformar ideias de baixo carbono resilientes às mudanças climáticas em estratégias e projetos prontos para financiamento.

Revisão do Modelo de Negócios

Para executar as recomendações acima, os BMDs precisam rever os seus modelos de negócio através da padronização, da otimização dos balanços patrimoniais, da elegibilidade para financiamento concessional e de mais transparência. 

Padronização

A maior padronização dos produtos e sistemas em todos os processos dos BMDs pode aumentar também sua aceitação e impacto. 

  • A padronização dos indicadores de desempenho (Key Performance Indicators – KPIs) para as instituições financeiras públicas pode fomentar as ações e a coordenação dos BMDs, principalmente quando os KPIs ultrapassam os fluxos financeiros e medem a economia real ou impactos práticos. Também pode incluir a reformulação das metas de sustentabilidade (qualitativas ou quantitativas) para melhor interligar a mobilização de financiamento para o clima e o desenvolvimento e também para apoiar as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em nível nacional.
    • As metas dos BMDs relativas à mobilização do setor privado podem ajudar a aumentar a proporção entre o financiamento público e o financiamento privado nas atividades de financiamento.
    • Os KPIs em nível nacional devem se pautar pelo impacto, como o acesso à energia, e definir padrões para todas as IFDs nacionais orientados pelas necessidades do país, construindo uma ponte entre as agendas de ação climática e de desenvolvimento. A abordagem setorial nacional proposta acima apoia a vinculação do financiamento às métricas de impacto.
    • A adoção de iniciativas de padronização de investimentos para definir investimentos favoráveis ao clima, como investimentos resilientes ou infraestruturas sustentáveis, pode abrir as portas para toda uma classe de ativos, como aconteceu com os títulos verdes (green bonds). A FAST-Infra criou um sistema de rotulagem de aplicação global para ativos de infraestrutura sustentáveis. Da mesma forma, a Coalition for Climate Resilient Investment (CCRI) está trabalhando para integrar de forma mais eficiente os riscos climáticos físicos à tomada de decisões de investimento por meio da padronização.
    • Ferramentas padronizadas e simplificadas podem ajudar a reduzir os custos de transação por meio da criação de instrumentos financeiros mistos de pronto usopermitindo que os EMDEs evitem o modelo atual de veículos de financiamento misto personalizados. A replicação ou a ampliação de estruturas já existentes proporciona aos EMDEs maior flexibilidade em seu uso e um acesso mais rápido ao capital.[13]
    • A Mobilizing Institutional Capital Through Listed Product Structures (MOBILIST) apoia a listagem de determinados produtos, como fundos fiduciários e de capital privado, em bolsas de valores públicas globais e locais, por meio de um processo bastante padronizado, com o objetivo de promover oportunidades de investimento em EMDEs em grande escala.
    • A dívida soberana vinculada à sustentabilidade é um instrumento financeiro baseado em desempenho em que o emissor se compromete a atingir metas de sustentabilidade predefinidas e prospectivas, incluindo riscos ligados ao clima e à natureza em mercados de dívida soberana.[14]

    Otimização do balanço patrimonial

    Modelos de originar-para-distribuir devem ser adotados para intensificar consideravelmente a mobilização junto ao setor privado. O atual modelo de “originar-para-reter”, em que o BMD faz um empréstimo para sua própria conta e o retém até a data do término do empréstimo, não só imobiliza o capital por longos períodos de tempo, como também não aproveita totalmente as capacidades de originação e de redução de risco dos BMDs. Em contraponto, o modelo “originar-para-distribuir” cria carteiras (de dívida) para refinanciamento futuro com capital privado; ou seja, o BMD concede um empréstimo maior do que reteria em sua própria conta e depois “vende” a maior parte desse empréstimo por meio de emissão de títulos ou de agrupamento de empréstimos com posterior venda para o setor privado. Dessa forma, o investimento do setor privado será mobilizado “a montante” e reciclará o capital para aumentar a capacidade de empréstimo do BMD. A maioria dos BMDs adotam essa prática para otimizar seus balanços patrimoniais e gerir os níveis máximos de exposição etc., mas existem poucos exemplos de utilização proativa do modelo “originar-para-distribuir” como modelo operacional de negócios. Embora essas emissões de títulos necessitem de critérios de subscrição pré-acordados e de preços orientados para o mercado, bem como de ativos residuais suficientes nos balanços dos BMDs para garantir a manutenção de um modelo econômico viável, o novo modelo aproveitaria as capacidades dos BMDs (principalmente daqueles voltados para o financiamento junto ao setor privado) de originar e estruturar com vistas ao compartilhamento de riscos. 

    Volume e elegibilidade para o financiamento concessional

    O financiamento concessional é escasso. Por isso, o volume de financiamento concessional precisa aumentar e ser mais flexível em sua utilização para lidar com os riscos, e a elegibilidade e o acesso a ele precisam ser reformados para aumentar a eficácia. Os gestores de fundos de financiamento misto afirmam que garantir o financiamento público leva mais tempo e é mais trabalhoso do que o capital privado.

    • Eficiência do financiamento concessional: leilões reversos de capital concessional (por exemplo, capital first-loss) para gestores de fundos podem maximizar o impacto dos recursos públicos e trazer mais transparência para o financiamento público, reduzindo, ao mesmo tempo, o tempo e os custos de transação. 
    • Riscos climáticos: todos os projetos devem ser analisados quanto aos riscos climáticos, e todos os projetos que recebem financiamento concessional devem ser resilientes. Além disso, a vulnerabilidade deve ser um critério para receber financiamento para adaptação, garantindo, assim, que os países com maior vulnerabilidade recebam mais financiamento. 
    • Recompensar a ambição: os países com planos de ação climática mais ambiciosos e evidências de progresso devem ser elegíveis para maiores volumes de financiamento climático concessional e preços mais atraentes. É possível que os limites de exposição de mutuários individuais dos BMDs tenham que ser reexaminados para que se possa usufruir plenamente do possível aumento de financiamento.

    Compartilhamento de dados e transparência

    A padronização das plataformas de coleta e compartilhamento de dados pode ajudar os países a criar planos climáticos viáveis com base em dados setoriais e regionais aplicáveis e também auxiliar os investidores privados a entender melhor o desempenho dos investimentos. 

    Em termos de desempenho, o consórcio do banco de dados de risco do Global Emerging Markets (GEMS) reúne dados de inadimplência de crédito em investimentos de BMDs e IFDs. Disponibilizar publicamente esses dados e tornar o GEMS uma pessoa jurídica independente são fatores fundamentais para a expansão do financiamento do setor privado, especialmente nos modelos “originar-para-distribuir” descritos abaixo, uma vez que ajudam na compreensão por parte dos investidores e fortalecem a avaliação de risco dos ativos dos BMDs. Contudo, dados sobre desempenho — por exemplo, financiamento misto ou investimentos em projetos individuais — não estão prontamente disponíveis e, portanto, configuram barreiras ao desenvolvimento do mercado. 

    • Em termos de adaptação, bases comuns de dados e cenários climáticos reduziriam os custos de transação para os desenvolvedores de projetos, os países e as cidades elaborarem pedidos de financiamento e demonstrarem que seus projetos tratam dos riscos climáticos. 
    • Em todos os setores e regiões, a coordenação do acompanhamento transparente e padronizado e (idealmente) o compartilhamento de dados de financiamento climático baseados em projetos proporcionariam um melhor entendimento dos fluxos e tendências globais de financiamento climático.

    Os BMDs e BPDs podem replicar suas respostas anticíclicas a crises para enfrentar a crise climática. A forma como os BMDs distribuem atualmente os seus recursos precisa evoluir para refletir seu conjunto de ferramentas de resposta a crises, principalmente proporcionando instrumentos mais flexíveis, maior tolerância ao risco e decisões mais rápidas.[15],[16] O roteiro do Banco Mundial afirma que a instituição só tem financiamento suficiente para aproximadamente uma crise de média dimensão por década, o que é insuficiente para o cenário atual de policrises.[17] Os sucessos dos BMDs durante a pandemia de COVID-19 (e na crise financeira asiática que a antecedeu) precisam ser institucionalizados como ações regulares no status quo das operações comerciais.

    Além das Reformas nos BMDs

    As recomendações acima têm por foco as funções e responsabilidades dos BMDs no contexto atual da agenda de reformas desses bancos.

    É necessária mais capacitação tanto nos EMDEs quanto nos próprios BMDs, em apoio aos instrumentos e às revisões, para transformar cada ideia em um modelo funcional. Não há garantia de que as recomendações irão funcionar no contexto atual; nenhuma delas será capaz de resolver a crise climática por si só, e muitas poderão simplesmente não funcionar sem as reformas mais amplas propostas a longo prazo para os modelos de financiamento das Instituições Financeiras Internacionais (IFIs). Algumas ideias, como a utilização de seguros para mobilizar capital, são subutilizadas neste contexto e merecem uma reflexão mais aprofundada. Outras, como garantias, hedging de risco cambial, modelos de elaboração de projetos e padronização, podem ser operacionalizadas e ampliadas no curto prazo.

    Existem outros atores e ações críticas que precisam ser realizadas em apoio à agenda mais ampla da reforma da arquitetura financeira internacional. Eles incluem:

    • O FMI e outros bancos públicos de desenvolvimento e suas responsabilidades globais e/ou nacionais na facilitação do financiamento climático e na mobilização de capital privado; 
    • Arcabouços globais como o International Sustainability Standards Board (ISSB) e outras reformas futuras da regulamentação bancária e de seguros que, quando adotadas pelos reguladores nacionais, precisam garantir que não prejudicarão os fluxos financeiros dirigidos às economias em desenvolvimento; e
    • Os governos das economias desenvolvidas, especialmente os do G7 e/ou da União Europeia, que precisam apoiar investimentos climáticos com impactos reais na economia. Por exemplo, a regulamentação fiduciária dos fundos de previdência deve permitir, e não restringir, o aumento do investimento nas economias emergentes, nas quais o risco real é superior ao precificado. 

    Todos os principais atores políticos do sistema financeiro global terão de reconhecer o seu papel fundamental para, de fato, aumentar a escala e a qualidade do financiamento sustentável que se fará necessário nas próximas décadas. Nenhuma organização é capaz de promover essa mudança sozinha — a nova liderança no Banco Mundial terá que ser combinada com uma liderança renovada em todos os níveis e disposta a trabalhar como parte de um sistema.

    Os últimos anos foram repletos de crises simultâneas, incluindo a crise climática, e revelaram a necessidade de se reformar a arquitetura financeira internacional. Este artigo contribui para essa discussão, destacando modelos específicos e mudanças operacionais que podem ser adotadas e ampliadas com a velocidade necessária para atender às atuais necessidades globais.

    Anexo I. Resumos Técnicos

    A lista abaixo é uma amostra de iniciativas promissoras apresentadas pelos idealizadores de cada projeto ou ideia. O CPI não validou as informações das iniciativas; todas as ideias são de competência exclusiva da organização elencada.

    OrganizaçãoIdeiaDescrição
    Allied Climate PartnersUnidade de PPF da Allied Climate PartnersMecanismo de elaboração de projetos para ampliar o pipeline de projetos financiáveis e relacionados ao clima no Sul Global.
    Climate Policy Initiative (CPI)Mecanismo de garantia de crédito de dívidaMecanismo de garantia de crédito de dívida para arcar com o custo de capital de energias renováveis e outros projetos climáticos em mercados emergentes, com base em capital exigível.
    GreenmapiTrustMecanismo que fornece garantias personalizadas e programadas para promover os investimentos do setor privado na geração de energia renovável.
    IntellidexJETPAbordagens para resolver entraves na mobilização de financiamento do Norte global para o JET, principalmente para elementos de justiça social.
    NatureFinanceDívida soberana vinculada à sustentabilidadeA dívida soberana vinculada à sustentabilidade (Sustainability-linked Sovereign Debt – SLSD) é um instrumento financeiro baseado em desempenho, em que o emissor se compromete a atingir metas de sustentabilidade predefinidas e voltadas para o futuro.
    Public Infrastructure Development Group (PIDG)GuarantCoAs soluções de crédito em moeda local desbloqueiam o potencial dos mercados de capital locais e ajudam a preencher a lacuna de financiamento para infraestrutura nos países de renda inferior.
    Public Infrastructure Development Group (PIDG)InfraCoOferece financiamento para infraestrutura por meio de investimento de capital de risco via equity ou da redução do risco através de dívida, criando um pipeline de investimentos financiáveis e sustentáveis e mobilizando capital de terceiros em grande escala.
    TCXTCX SquaredCria mercados de risco cambial para mitigar o risco cambial em grande escala.

    Os autores gostariam de agradecer aos colaboradores e revisores deste projeto, que inclui o documento de discussão Um Modelo Operacional IFI Inovador para o Século XXI, o Roteiro de Mobilização de Capital e os resumos técnicos de apoio. Isso inclui Jean-Paul Adam, Comissão Econômica das Nações Unidas para a África, Mathilde Bord-Laurans, Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), Sagarika Chatterjee, Campeãs Climáticas da ONU, Asgar Garnak, Concito, Lily Han, Fundação Rockefeller, Harald Hirschhofer, TCX, Michael Hugman, Fundação do Fundo de Investimento para Crianças (CIFF), Sony Kapoor, NIFTYS, Sebastian Kind, Greenmap, Arend Kulenkampff, NatureFinance, Rachel Kyte, The Fletcher School at Tufts University Naidoo, Rabia Transitions Initiative, Dhruba Purkayastha e Neha Khanna, CPI, Taylor Ray, Three Cairns Group, Rémy Rioux, Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) Katherine Stodulka, SystemIQ, Josué Tanaka, Instituto Grantham sobre Mudança Climática, LSE, Philippe Valahu, The Private Grupo de Desenvolvimento de Infraestrutura (PIDG) e Bill Weil, Tempest Advisers pora suas contribuições em resumos técnicos de revisão e/ou suporte. Os autores agradecem a Rob Kahn, Caroline Dreyer e Elana Fortin pela revisão e trabalho de design gráfico. Os autores também reconhecem as contribuições e discussões entre os participantes do IX Encontro do Grupo San Giorgio, realizado nos dias 23 e 24 de março 2023 em Veneza, Itália, que deram início ao trabalho.

    Enquanto este relatório é baseado nas discussões entre os participantes durante o 9º reunião do Grupo San Giorgio, CPI assume total responsabilidade por todas as suposições feita em sua recapitulação dessas discussões. Comentários não são atribuídos como as discussões ocorrem sob as Regras da Casa Chatham.


    [1]    O CPI organiza o Grupo San Giorgio (SGG), um grupo de trabalho dos principais intermediários financeiros e instituições ativamente envolvidas no financiamento verde e de baixas emissões. Estabelecido em colaboração com World Bank Group, China Light & Power e OCDE, o SGG reuniu-se nove vezes desde 2010.

    [2]     V20. Climate Prosperity Plans. sd. bit.ly/3udsttS.

    [3]     The Presidency Republic of South Africa. South Africa’s Just Energy Transition Investment Plan, 2023-27. 2022. bit.ly/3siZRz5.

    [4]     Rabia Transitions. bit.ly/466ogp9.

    [5]     V20. Climate Prosperity Plans. sd. bit.ly/3udsttS.

    [6]     Naran, Baysa et al. Global Landscape of Climate Finance: A Decade of Data. Climate Policy Initiative, 2022. bit.ly/40ssrdP.

    [7]    Songwe V., Stern N., and Bhattacharya A. Finance for climate action: Scaling up investment for climate and development. London: Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment, London School of Economics and Political Science. 2022. bit.ly/3FP30JM.  

    [8]    Songwe V., Stern N., and Bhattacharya A. Finance for climate action: Scaling up investment for climate and development. London: Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment, London School of Economics and Political Science. 2022. bit.ly/3FP30JM.  

    [9]     IMF. Global Financial Stability Report – Navigating the High-Inflation Environment. 2022. bit.ly/475JkO3.

    [10]    OECD. Private Finance Mobilized by Official Development Interventions. 2023. bit.ly/3QsJzeV.

    [11]   Schclarek, Alfredo, and Xu, Jiajun. ”Exchange rate and balance of payment crisis risks in the global financial architecture”. Journal of International Financial Markets, Institutions and Money 79, 101574 (2022). bit.ly/3u9U2Va.

    [12]    Nassiry, Darius. Clean energy project preparation facilities: Mapping the global landscape. ODI, 2018. bit.ly/3FRehJL.

    [13]    Tonkonogy, Bella et al. Blended Finance in Clean Energy: Experiences and Opportunities. Climate Policy Initiative, 2018. bit.ly/3FT8jZ0.

    [14]    Nature Finance. Sustainability-linked Sovereign Debt Hub. 2023. bit.ly/3FSPcOu.

    [15]   Griffith-Jones, Stephany. Whether and how public financing and investment for development be scaled-up? What challenges does this pose for public leadership in this area, at domestic and international levels? UNCTAD, 2022. bit.ly/49rs1sd.

    [16]    Global Climate Action. Climate action pathway finance: Vision and Summary. 2021. bit.ly/3u5LYor.

    [17]    World Bank. Evolving the World Bank Group’s Mission, Operations, and Resources: A Roadmap. 2022. bit.ly/40vqH3o.

    ACESSE O ESTUDO EM INGLÊS

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