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Os problemas fundiários no Brasil são tão velhos quanto nossa própria história. Até os dias de hoje, milhares de imóveis rurais estão em situação irregular, muitos agricultores não possuem títulos de propriedade e há espaços onde não é possível afirmar com certeza quem possui os direitos de propriedade sobre a terra. No Brasil, há vários municípios com áreas registradas que superam em uma, duas ou mais vezes a sua superfície territorial. Os problemas fundiários vão muito além do âmbito legal, gerando custos sociais, econômicos e ambientais. Violência no campo, mal funcionamento de mercados de terra e desmatamento ilegal são exemplos desses efeitos colaterais.

A ocupação do território brasileiro foi bastante desordenada, sem controle pelo poder público e sem a adequada separação entre as terras públicas e privadas. Além disso, devido à ausência de um cadastro único de terras, reunindo informações geográficas e jurídicas das propriedades e posses no Brasil, as políticas fundiárias foram promovidas sem o conhecimento preciso do espaço, resultando em sobreposições territoriais. Esta falta de controle facilitou a apropriação ilegal de terras públicas por particulares, fenômeno conhecido por grilagem, adicionando
complexidade e irregularidade ao quadro agrário brasileiro. Ferramentas tecnológicas recentes, como o georreferenciamento e sistemas de informação, têm servido para mudar este cenário. Porém, sem a integração das informações produzidas em uma base cartográfica única e transparente não será possível implementar uma governança fundiária eficiente.

Mais recentemente, com a aprovação do novo Código Florestal, os problemas fundiários se tornaram ainda mais evidentes em certas áreas. Isso porque a obrigação de cadastrar todos os imóveis rurais no Cadastro Ambiental Rural (CAR), com informações georreferenciadas do imóvel, revela não só os problemas ambientais mas também fundiários. Quanto mais bem definido o direito de propriedade, melhor será a identificação do responsável ambiental e, consequentemente, a implementação do Código Florestal. É fundamental, portanto, que os problemas fundiários sejam resolvidos para o sucesso da nova lei florestal.

Para entender a atual situação da questão fundiária no país é importante pesquisar, em primeiro lugar, como se deu historicamente a ocupação territorial brasileira. O Capítulo 1 mapeia a legislação fundiária aplicável aos imóveis rurais, desde a colonização até a instituição da Constituição Federal de 1988. Em segundo lugar, é necessário investigar como funciona o sistema de gestão fundiária. O Capítulo 2 examina o sistema registral brasileiro, os diferentes cadastros rurais e o sistema de gestão das terras públicas, apontando os problemas e avanços neste tema. Em terceiro lugar, é fundamental compreender os processos de regularização fundiária. O Capítulo 3 analisa a legislação de cinco categorias fundiárias específicas (Terras Indígenas, territórios quilombolas, Unidades de Conservação, assentamentos da reforma agrária e posses em terras públicas federais) e identifica os principais entraves e ameaças à efetivação de seus direitos territoriais. Por fim, o novo Código Florestal adiciona um nível de complexidade. O Capítulo 4 estabelece a relação entre os direitos de propriedade e a implementação do novo Código Florestal, ressaltando os desafios para a aplicação das regras florestais às propriedades e posses coletivas da terra.

DESTAQUES DO RELATÓRIO
  • Durante muito tempo, a legislação fundiária brasileira impôs restrições ao acesso à terra. Sem alternativas legais, vastas extensões do território foram ocupadas à margem da lei, pela simples posse da terra, criando desigualdades e ineficiências. No período colonial, a aquisição de sesmarias era concedida apenas aos “amigos do rei”. Posteriormente, com a Lei de Terras de 1850, as terras públicas só poderiam ser adquiridas por compra e venda. Somente a partir da metade do século XX é que foram adotadas políticas fundiárias mais abrangentes, com a finalidade de democratizar o acesso à terra.
  • Existe uma pluralidade de cadastros rurais com finalidades distintas (fiscal, econômica, de planejamento fundiário e ambiental) que se somam ao sistema de registro imobiliário. O registro e os cadastros são geridos sem coordenação e sem uma base cartográfica única. Não há um cadastro conjunto de terras públicas federais e estaduais com informações precisas e confiáveis. A falta de acuracidade dos dados registrais e cadastrais gera insegurança jurídica e conflitos.
  • O Cadastro Ambiental Rural (CAR), instituído pelo Código Florestal, é mais um cadastro que se soma ao complexo sistema de cadastros rurais ativos no país. Apesar dos avanços do CAR para o planejamento ambiental e combate ao desmatamento ilegal, a falta de integração do banco de dados do CAR aos demais cadastros rurais é uma oportunidade perdida de se avançar no combate à grilagem, de ajudar na solução de conflitos fundiários e de garantir maior segurança jurídica.
  • Se de um lado a propriedade privada encontra-se melhor consolidada, de outro lado, a posse coletiva da terra e a de pequenos agricultores ainda enfrentam desafios e entraves para a consolidação de seus direitos territoriais. O território brasileiro é formado por um conjunto de categorias fundiárias que inclui, além da propriedade privada, a posse de pequenos agricultores e de comunidades tradicionais, as Terras Indígenas, os territórios quilombolas, as Unidades de Conservação e os assentamentos da reforma agrária. Processos de regularização fundiária complexos e longos, conflitos pela posse da terra e pressões políticas e econômicas impedem a efetivação desses direitos.
  • O novo Código Florestal não determina de forma clara como será a sua aplicação nos casos de posse coletiva da terra, sendo que estas categorias ocupam uma extensão territorial expressiva e que boa parte destas áreas são cobertas com vegetação nativa.
PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES
  • Fortalecer e impulsionar as políticas de regularização fundiária de agricultores familiares e populações indígenas e tradicionais por meio da simplificação dos processos de regularização e da unificação das normas legais vigentes.
  • Acelerar a implantação do Cadastro Nacional de Imóveis Rurais e fortalecer o seu papel como principal cadastro fundiário, através da integração dos demais cadastros rurais e do intercâmbio com os registros de imóveis, possibilitando a criação de uma base cartográfica única.
  • Acelerar a implantação do sistema unificado de administração do patrimônio da União e prever a sua integração aos sistemas de administração de terras públicas estaduais e municipais para criar um cadastro único de terras públicas.
  • Intensificar o combate à grilagem de terras por meio da criação de procedimentos administrativos próprios que visem ao cancelamento de registros imobiliários irregulares.
  • Assegurar a alocação de recursos financeiros, inclusive por meio de instrumentos econômicos, para a indenização de proprietários e posseiros nos processos de regularização fundiária de Unidades de Conservação.
  • Reforçar os mecanismos de mediação e conciliação para a solução de conflitos envolvendo comunidades tradicionais em Terras Indígenas e Unidades de Conservação.
  • Aprimorar a gestão e a fiscalização dos assentamentos da reforma agrária a fim de corrigir as irregularidades na criação dos assentamentos, na seleção dos beneficiários e no repasse ilegal dos lotes para terceiros.
  • Normatizar de forma clara e objetiva como será a aplicação do Código Florestal nos casos de posse coletiva da terra, considerando as particularidades de cada uma das categorias fundiárias.
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