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A transição do Brasil para uma economia de baixo carbono vai exigir recursos financeiros compatíveis com a meta climática estabelecida pelo país em sua NDC, no âmbito do Acordo de Paris. Entretanto, uma questão central é saber de onde virão os recursos para atingir a meta pretendida.

Embora a NDC do Brasil seja “economy wide”, ou seja, adote uma meta vinculante de redução de GEE para toda a economia e não metas setoriais, as atividades relacionadas ao uso da terra possuem relevância incontestável tendo em vista o perfil de emissões do país. Isso requer que sejam desenvolvidas estratégias de financiamento que promovam a transição para uma agropecuária de baixo carbono, protejam as florestas, aumentem a resiliência climática e reduzam as vulnerabilidades socioeconômicas aos impactos negativos das mudanças climáticas.

O ecossistema de financiamento climático para uso da terra no Brasil é complexo, possuindo uma pluralidade de atores e arranjos institucionais. O presente relatório mapeia os fluxos financeiros para a agropecuária e as florestas que estão alinhados os objetivos climáticos de mitigação e adaptação e fornece uma visão abrangente de quais fontes e instrumentos financeiros estão impulsionando o investimento, quanto está fluindo e para quais setores. A publicação de informações sobre esses fluxos é crucial para medir o progresso, identificar lacunas e otimizar a destinação de recursos públicos e privados, dando maior transparência e permitindo a responsabilização dos atores envolvidos.

Este trabalho identificou uma média de R$ 25,1 bilhões/ano em financiamento climático para uso da terra no Brasil entre 2015 e 2020. Um resultado relevante é que 95% dos recursos alinhados a objetivos climáticos provêm de fontes domésticas, responsáveis por R$ 23,8 bilhões/ano no período. Existe muita expectativa de que o país consiga atrair grandes volumes de financiamento internacional para a agenda de clima, mas os números mostram que a captação de recursos internacionais se encontra muito aquém do potencial.

Além disso, o setor público é relevante para o financiamento climático para uso da terra tanto como fonte de recursos quanto como mobilizador de recursos privados. As despesas do orçamento público federal foram responsáveis por canalizar 11% dos recursos mapeados. No entanto, foi identificado que grande parte dos recursos com fonte privada é mobilizada por políticas públicas. Esse é o caso, principalmente, do crédito rural, em que a política agropecuária exige que as instituições financeiras direcionem parte de seus recursos para determinadas linhas. Também é o caso de CBIOs, em que há obrigatoriedade de redução das emissões de CO2 por parte dos distribuidores que comercializam combustíveis.

Um outro ponto de destaque é que 68% dos fluxos financeiros estão associados a ações de mitigação, enquanto 19% são para adaptação e 13% têm objetivos tanto de mitigação como de adaptação. Em um contexto em que produtores rurais são cada vez mais impactados por eventos climáticos extremos, ações de adaptação têm se tornado necessárias para gerenciar o risco e aumentar a resiliência da atividade agropecuária. Aumentar os fluxos de financiamento climático para adaptação é um desafio enfrentado globalmente (Buchner et al. 2021).

Para que o financiamento climático seja ampliado e aperfeiçoado de forma a alcançar a escala necessária para enfrentar os desafios de mitigação e adaptação do Brasil, um conjunto de medidas e ações devem ser tomadas por atores públicos e privados nas diferentes áreas, a saber:

Política de crédito agropecuário

O crédito rural é a principal fonte de financiamento climático para o uso da terra no Brasil com R$ 12,0 bilhões/ano identificados como alinhados a objetivos de mitigação e/ou adaptação. No entanto, esse valor corresponde a apenas 8% do volume total do crédito rural com as finalidades de custeio, investimento e industrialização.

É preciso que todo o Plano Safra esteja comprometido com sustentabilidade, oferecendo condições diferenciadas de crédito para produtores com práticas modernas e de baixo carbono. Dessa forma, a política pública proverá incentivos para a inovação, o aumento da produtividade agropecuária e a proteção ambiental. Além disso, é necessário impedir a concessão de crédito para propriedades com desmatamento ilegal e com áreas embargadas por órgãos federais e estaduais em todos os biomas (Stussi e Souza 2023).

O Plano Safra 2023/2024 trouxe mecanismos relevantes para promover atributos socioambientais na produção agropecuária e impedir ilegalidades na concessão do crédito rural. Contudo, ainda restam definições e lacunas importantes para que a política tenha impacto efetivo na transição para uma agropecuária de baixo carbono e na proteção da vegetação nativa.

Gestão de risco agropecuário

Os instrumentos de gestão de risco agropecuário, principal mecanismo de adaptação climática por diminuir a vulnerabilidade dos produtores a eventos extremos, totalizaram R$ 4,0 bilhões/ano entre 2015 e 2020.

A agropecuária brasileira vem sofrendo as consequências de eventos extremos cada vez mais frequentes decorrentes das mudanças climáticas. No ano agrícola 2021/2022, a forte estiagem levou à expressiva quebra de safra, com as indenizações do seguro rural crescendo mais de quatro vezes em relação à safra anterior, de acordo com dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep).

No entanto, a cobertura do seguro rural e de outros instrumentos de gestão de risco agropecuário ainda é limitada. Além disso, o risco cada vez mais elevado de perdas de safra tende a reduzir a oferta de seguro e aumentar o preço dos prêmios, podendo restringir ainda mais o acesso ao seguro. A política pública, incluindo os subsídios aos prêmios do seguro rural, como o PSR, pode estimular a expansão dessa cobertura, favorecendo produtores e regiões ainda pouco atendidos, assim como produtores com práticas sustentáveis (Souza, Oliveira e Stussi 2023).

Gastos do governo

As despesas do orçamento público federal para uso da terra com objetivos de mitigação e adaptação climática totalizaram, em média, R$ 2,8 bilhões/ano entre 2015 e 2020, representando 11% do total mapeado para esse período. É importante ressaltar a queda de 39% em termos reais no financiamento climático canalizado pelo orçamento público, que passou de R$ 3,3 bilhões em 2015 para R$ 2,0 bilhões em 2020.

O orçamento público é o principal instrumento canalizador de recursos para políticas no setor de florestas, que envolve ações de conservação, restauração e reflorestamento. O funcionamento do MMA e de órgãos como o Ibama, o ICMBio e a Funai, essenciais para a preservação ambiental, o combate ao desmatamento e a proteção dos povos indígenas, depende desses gastos do governo.

A continuidade da política pública é necessária para que os programas e as ações governamentais apresentem resultados efetivos e duradouros. Dessa forma, é importante que o planejamento e o financiamento das iniciativas governamentais relacionadas às mudanças climáticas sejam concretos e de longo prazo.

Mercado financeiro

O financiamento climático para uso da terra obtido por meio de emissões de títulos temáticos aumentou quase quatro vezes no período analisado, passando de R$ 2,3 bilhões em 2015 para R$ 8,6 bilhões em 2020. Para o período de 2015 a 2020, as emissões de títulos temáticos corresponderam a 16% dos recursos mapeados. Também foi relevante a aprovação pelo BNDES de R$ 897 milhões/ano para financiamento climático com crédito de baixo custo no período analisado. Além disso, foram negociados R$ 650 milhões em CBIOs em 2020, primeiro ano em que foram emitidos.

Nesse sentido, torna-se um desafio o mapeamento e a quantificação de como operações bancárias e captações de recursos no mercado de capitais contribuem para o financiamento climático. As dificuldades de acesso a informações implicam que esses fluxos de financiamento climático tendem a estar subestimados. É preciso melhorar a transparência das fontes de dados, estabelecer diretrizes para classificar os fluxos e aumentar a disponibilidade de dados granulares em nível de projeto, bem como a localização dos mesmos. Regulamentações e normas mais claras de divulgação de informações permitirão estimativas mais precisas.

A mobilização de recursos privados em escala é fundamental para financiar a transição para uma economia de baixo carbono. Os recursos públicos não serão suficientes para atingir as metas climáticas. O potencial brasileiro para alavancar práticas agropecuárias sustentáveis e promover a conservação e o restauro de florestas representa uma grande oportunidade de atrair recursos privados. Em especial, o mercado de carbono pode ser uma importante fonte de recurso para a agenda.

Desenvolvimento e cooperação internacional

As fontes de recursos para desenvolvimento e cooperação internacional canalizaram R$ 1,2 bilhão/ano em financiamento climático para uso da terra no Brasil entre 2015 e 2020, o que representa 5% dos fluxos financeiros alinhados ao clima. Os governos internacionais (R$ 518 milhões/ano) e os fundos climáticos (R$ 472 bilhões/ano) são as principais fontes de recursos, com destaque para o Fundo Amazônia (R$ 183 milhões/ano). 

Grande parte do financiamento internacional foi alocada para políticas públicas e estratégias relacionadas à redução do desmatamento, áreas protegidas, regularização ambiental e fundiária e ordenamento fundiário.

Para atrair maior volume de recursos internacionais para o financiamento climático no Brasil, é fundamental que o país tenha uma política governamental comprometida com o meio ambiente e o clima, com clareza em relação às diretrizes e metas ambiciosas. Isso inclui o comprometimento para zerar o desmatamento, a transição para uma agropecuária de baixo carbono e a ampliação do uso de energia limpa. Estabelecer metas de financiamento para setores específicos pode facilitar o fluxo para áreas estratégicas.

Relatório Completo (em pdf)

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