Finanças
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Por — São Paulo

Entre 2020 e 2024, o Plano Safra liberou R$ 205,6 bilhões em crédito rural subsidiado para propriedades rurais que registraram desmatamento, legal ou ilegal, desde 2009, segundo estudo do Climate Policy Initiative/PUC-Rio (CPI/PUC-Rio), publicado no Globo Rural. Esse valor representa 36% de todos os financiamentos com subvenção federal no período. Os bancos públicos lideram as concessões desses empréstimos. Ouvidas pela reportagem, as instituições financeiras negam irregularidades e criticam as bases de dados do estudo.

O que diz o estudo

A linha de corte adotada foi 2009 devido à anistia aos desmatamentos ilegais anteriores a julho de 2008 prevista no Código Florestal. Cerca de 17% do total liberado foi destinado a propriedades com desmatamento entre 2020 e 2023, 15% para aquelas com desmatamento entre 2013 e 2019 e 4% para propriedades com desmatamento entre 2009 e 2012.

Contudo, segundo o levantamento do CPI/PUC-Rio, apenas 8,4% do crédito foi destinado a propriedades que desmataram após receber o financiamento; a maior parte do corte de árvores ocorreu antes da concessão do crédito.

Mesmo assim, a análise revela que uma parcela significativa das propriedades desmata de forma recorrente, “possivelmente utilizando recursos do crédito rural subsidiado para financiar o desmatamento”, traz o documento elaborado pelo CPI/PUC-Rio.

A pesquisa sugere que há uma forte correlação entre o crédito rural subsidiado e o desmatamento e argumenta que é necessário dissociar os financiamentos de qualquer tipo de desmatamento, mesmo o legal. O estudo defende que recursos públicos devem ser alocados para produtores que atuam na mitigação da crise ambiental e climática, contribuindo para o combate ao desmatamento.

Quem emprestou dinheiro

Os bancos públicos, como o Banco da Amazônia (71%), Banco do Nordeste (52%), Caixa Econômica (49%), Banrisul (48%) e Banco do Brasil (36%), foram responsáveis pela maior parte dos financiamentos a propriedades associadas ao desmatamento, de acordo com o levantamento. Esses percentuais referem-se ao total de crédito rural desembolsado entre agosto de 2023 e julho de 2024.

Em resposta, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirmou que as instituições financeiras não apoiam práticas ambientais inadequadas, destacando que o setor bancário foi pioneiro no compromisso com as questões climáticas e que as operações são reguladas pelo Banco Central e pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), com diversas restrições.

A federação também ressaltou a necessidade de as instituições financeiras terem acesso a dados ambientais atualizados das propriedades para melhorar a gestão de riscos pelos bancos e pediu agilidade na análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Questionamentos sobre a base de dados

Por outro lado, um dos bancos questionou o uso do Programa de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), como base de dados para o estudo, argumentando que o sistema acumula registros e alertas ao longo dos anos, considerando, até hoje, áreas já recuperadas.

O diretor-executivo do CPI/PUC-Rio, Juliano Assunção, defendeu o uso dos dados do Prodes, afirmando que ele é o dado oficial de desmatamento do país, apesar das críticas. “A recuperação da área em período posterior é outro dado, e que não invalida o dado do desmatamento”, diz.

Outra preocupação foi levantada quanto à análise do Prodes no bioma Pampa, no Rio Grande do Sul, que é tratado como desmatamento devido às características da vegetação. Para as instituições financeiras, as diferenças nos dados entre o Prodes e a plataforma MapBiomas, que costumam utilizar, podem resultar em interpretações divergentes.

Legal ou ilegal

O estudo não distinga desmatamento legal de ilegal, mas sim áreas onde houve supressão de vegetação nativa. Mesmo assim, recomenda que os bancos adotem análise criteriosa das propriedades antes da concessão do crédito, incluindo a exigência da autorização legal para o desmate e restrição total a práticas irregulares.

Na reportagem, Priscila Souza, gerente sênior de avaliação de políticas públicas do CPI/PUC-Rio, reconhece que houve avanços na adoção de critérios de sustentabilidade para o crédito rural, mas reforça que o objetivo final deve ser o "desmatamento zero". Para ela, os financiamentos subsidiados devem ser destinados exclusivamente a propriedades que não tenham realizado desmatamento, independentemente da legalidade da supressão da vegetação.

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